Questão de domínio

Mais do que nunca a América é objecto de estudo da sociedade moderma, não só como simulacro do avanço da civilização humana mas muito pelo despertar de conflitos internos que se propagam para lá das suas fronteiras. Como se o país, no seu todo, fosse o espólio das contradições e obsessões que põe as capacidades do Homem em questão na sua destreza para enfrentar as credulidades do dia-a-dia. “A Obsessão Antiamericana” é um livro de 2003. «A vida é um cemitério de lucidezes retrospectivas.», diz o autor do livro, Jean-François Revel. Existe em cada era a oportunidade de mostrar um pouco de lucidez, que é menos uma questão de inteligência que de coragem. É preciso chegar a um patamar em que o ponto de observação é vasto e não se obstrui com concepções pre-estabelecidas. «O mistério do antiamericanismo não está na desinformação, pois é fácil obter informação sobre os Estados Unidos, mas sim na vontade de ser mal informado.» Há uma continua vontade de generalizar factos para dar continuação a uma imagem que não funciona de modo autónomo e dizer-se dos americanos e das suas acções para se poder comparar e mostrar o volume do resto do mundo.
Há a questão da ameaça, o jugo que se propõe na figura do "medo" que fez da história dos EUA um pequeno campo de batalha. A América foi sempre olhada com um misto de inveja e de desprezo por todos os países do mundo, em particular pelos países europeus. Sob o pretexto de se ter tornado a única superpotência do planeta, após o descalabro do império comunista, os alicerces dessa realidade criaram muitas vezes ressentimentos irracionais geradores de informações deturpadas e de fobias que decorrem dos fracassos de países que criticam sem cessar os Estados Unidos, atribuindo-lhes frequentemente defeitos apenas imaginários. Gerando um contexto antiamerico geral.
É tentadora a ideia de que o antiamericanismo é um fenómeno recente porque se torna mais fácil encontrar uma justificação e tentar evitar confusões com a xenofobia. Não é também a figura de um presidente que constrói a imagem de uma nação e que faz dela a face de muito do seu descrédito. É mais comum, no entanto, associar o antiamericanismo aos receios da hegemonia, e aí as suas raízes são profundas na Europa, especialmente em França, estando intimamente ligadas à perda de influência mundial que o continente perdeu no século XX e sobretudo ao factor de integração de diferentes faces da raça humana. Ser americano, na verdade, é sempre um pouco de tudo, e ao mesmo tempo não ser nada em concreto e isso paga-se pelas bocas de todo o planeta.

SOBRE O AUTOR
Filósofo, escritor e jornalista, Jean-François Revel, membro da Academia Francesa, morreu, aos 82 anos, em Abril de 2006. Figura da direita intelectual, anticomunista e ateu, Revel, nascido em 19 de Janeiro de 1924, em Marselha, estudou Filosofia na Escola Normal Superior e, a partir dos anos cinquenta, desenvolveu uma dupla carreira literária e jornalística. Deu aulas na Argélia (1947-1948), depois no México e em Florença, antes de regressar a França. Em 1963, abandona a universidade, dedicando-se totalmente à literatura e ao jornalismo. Inicialmente conotado com a esquerda, dirige as páginas literárias do France Observateur, de 1960 a 1963. Foi também conselheiro das edições Julliard e Robert Laffont, e fundou uma colecção na editora Pauvert.

A Obsessão Antiamericana, de Jean-François Revel
BERTRAND EDITORA • ENSAIOS E DOCUMENTOS • 2003

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