Na esquina de uma árvore. Meio da tarde. Céu cinzento. Dez graus, muita humidade.
- E o José Borges, que me dizes?
- Quem?
- O José Borges, aquele gajo argentino, meio cego, que anda para aí aos trambolhões.
- Não sei do que estás a falar. É gajo do futebol?
- Não! Qual quê, qual futebol!? Também só pensas nisso.
- Eh pá, com este frio o que é que queres que eu pense?
- Sei lá, podias pensar noutra coisa. Podias pensar em gajas que sempre é uma coisa quentinha.
- Ora, mas isso penso eu, tu é que vens com essa conversa do João Borges.
- José Borges, meu! Escritor argentino.
- Ah sim? E o que é que ele escreveu? Escreveu alguma coisa de jeito. Escreveu sobre gajas?
- Escreveu. Escreveu sobre coisas e cidades onde tu te perdias logo, porque nunca pescas nada do sítio onde estás e também és um bocado para o zarolho. E bibliotecas e labirintos. Sim, também escreveu sobre algumas gajas. Normalmente, elas nunca morriam, e às vezes tinham duas cabeças, uma para falar contigo e outra para fumar um cigarro.
- Tché. E tu ainda queres que eu não pense em futebol. Zarolho era a tua tia. Se calhar querias que eu lesse, ainda para mais uma coisa desse gajo, Joel Borges. Daaasss!
- Eu vi logo. Não se pode falar nada contigo. Também me saíste uma grande companhia.
- Mas o gajo era cego, era? Andava aos trambolhões?
- Vá deixa lá. Não interessa. Diz-me mazé, aquela miúda de ontem, grande naco, deste cabo dela?
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