Qualquer Um

Julga-se que Philip Roth foi buscar o título original deste livro, Everyman, a uma peça de teatro medieval de um autor anónimo em que Deus, descontente, diz à Morte que está na hora de Everyman empreender a última viagem pois tem de lhe prestar contas do seu comportamento na Terra, o usual: a procura da riqueza (material) e a busca dos prazeres. A narrativa desta novela inicia-se com o funeral de uma personagem não identificada e depois em inversão (flashback), o narrador desfia as memórias da sua vida até ao momento em que é submetido a uma operação a uma carótida que estava obstruída onde opta por uma anestesia geral da qual não acordará. Esta não é uma narrativa moral como a mencionada peça, é de arrependimento, e diferentemente do que diz a canção de Sinatra, Everyman tem muitos e que se revelam com a falta de saúde e da aproximação do ocaso, para os quais de resto também não estamos preparados. Esta revisão, segundo o narrador de Roth, deveria merecer o simples título de Vida e Morte de Um Corpo Masculino, porque "os nossos corpos nasceram para viver e morrer nos termos decididos pelos corpos que tinham nascido e morrido antes de nós". E assim a par da decadência física de Everyman, particularmente desde que se muda para uma aldeia de reformados na costa de Nova Jersey, Starfish Beach, numa sequência de complicações renais, inserção de stents para reparar obstruções arteriais até à implantação definitiva de um desfibrilador, na história da vida e da morte deste qualquer um, recrimina-se finalmente das coisas que tinha desperdiçado contra si sem qualquer razão aparente. Da boa Phoebe de quem se separou para juntar-se a uma dinamarquesa vinte seis anos mais nova, da má relação com os filhos do primeiro casamento, que não se empenhou em tornear e do irmão Howie que sempre lhe ajudou e de quem se afastou por lhe invejar a saúde. A distorção do seu carácter e as suas insuficiências estavam a deixar-lhe só quando se preparava para enfrentar a sétima operação. Decididamente, "a velhice não era uma batalha, era um massacre". É o génio de Roth que através da vida de um simples personagem faz-nos reflectir sobre os nossos receios, os nossos valores e o que conseguimos realizar. É por isso um bom livro.

Todo-o-Mundo, de Philip Roth
Editado em Maio de 2007 pela D.Quixote • Tradução de Francisco Agarez

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