Tomo II

Lime & Purple mais uma vez num lugar qualquer, um lugar sem importância, talvez uma Pastelaria.
- Sabes... já não tenho nada a dizer, não tenho paciência, nem para me aprofundar em comentários. Quer dizer com as pessoas com quem raramente lido... já não me apetece fazer nenhum bolo com elas!
- Hmmmm... Tem cuidado para não ficares numa concha, não se pode perder esta abertura ao mundo. Seja quem for... que cada um é como cada qual.
- Mas que mundo, que concha? Que abertura?
- Digo fechado na concha e ao mundo, às pessoas. Acho que é bom não se derrapar e cair no vício. É preciso voltar à tona como a baleia branca, que também serve de metáfora à epifania, ao rasgo de asa. Digo a mim que o que mais temo é a amargura, um certo misantropismo...
- Mas que queres, é que às vezes não me apetece mesmo...
- Nem a mim... mas já te disse isto uma vez, acho que é sempre preciso ultrapassarmo-nos, fugir da natureza... da nossa natureza e estabelecer, digamos, um compromisso.
- É isso às vezes não me apetece... negociar... Deixo-me ir como vou e pronto...
- Mas é assim, aqui onde vivemos, não tem piada, o deixar ir... por isso é preciso tomar uma outra posição.
- Sim, não tem.
- Mas... sei lá...
- Sei lá!
- Outro dia estive na igreja porque me sentia mal fisicamente e estava mal, em desequilíbrio. Fui procurar silêncio, respirar, fazia assim onde vivia antes de vir para esta terra.
- Respira-se mal aqui, o problema é esse... os sentidos respiram mal... enferrujam mais facilmente...
- Não era uma necessidade tanto espiritual... mas de elevação de mim próprio... um pouco de ascese, é isso. Como que procuro viver uma certa ascese e tudo o resto perde a expressão... Não perder de vista o longe, o horizonte, que já não existe como se sabe... como seguir pisando a linha que na praia separa a terra do mar. Isso é o importante.
- Mas isso da ascese nao é pores-te a decorar essa concha?
- Não. É deixar-me lá na concha e no mundo... e sair, ver-me ao longe, observar-me lá em baixo. Mas também é por aí que vamos, a decorar a concha... é uma sedução.
- Às vezes estou tão perto de um certo abismo... que quase o abraço com satisfação... por o reconhecer... por saber que ele me acompanha... atrás de uma certa montanha que também arrasto... mas que não tem espessura. Uma montanha infinita sem espessura... infinita em peso e em tamanho... mas sem expressão... sem sentimento... sem valor... bla bla bla... um reverso qualquer... de uma coisa importante... que é todo o nosso sentido... e que por isso está lá. Ainda hoje quando esperava pelo sinal verde para atravessar a estrada dei com o abismo debaixo de um camião e quase que lhe estendi o braço num compromisso de entre-ajuda. Percebe-se?
- Não! Mas tu percebes, não percebes?
- Mais ou menos... percebo e não percebo... Porque de uma maneira geral o mundo é para não perceber! Porque é mundo...
- Lá estamos nós, mas quem é que quer perceber o mundo? Percebe-se e não se percebe e qual o drama?
- Se um mundo fosse unidade, Lime, talvez se percebessse... mas assim... somos plasticina...
- Plasticina...
- E é na elasticidade que reside a nossa possível felicidade.
- Não somos pedra tens razão mas não é elasticidade, é este estádio intermédio entre o nada e o tudo...
- Que são a mesma coisa... o nada e o tudo, é o que acho... estou sempre a pensar nisso.
- Soundbytes portanto...
- Nada de muito mais ou Cesarinny, portantes! E assim está na hora de me pirar...
- Portantes! Palavra bonita. Quase tão bonita como "ascese."
- Até logo...
E o pano desce.

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