Local lá para fora

Às vezes, mesmo cá dentro, perco a noção do que se passa em Macau. Não sei se é puro desinteresse, se o que há, de maneira quase constante, não me desperta uma vontade ou qualquer desejo de conhecê-lo com mais detalhe. Essa coisa do saber, do estar a par. De ter coisas para dizer sobre a terra onde vivo, coisas mais profundas do que o vulgar encolher de ombros. O que há por aqui afinal?
Há uma vida cultural que vem como as ondas, isto é, às vezes vem, outras vezes não. Parece-me a mim que na maior parte do tempo o que temos é um lago de águas estanques, que não se movem. Sim, está lá a água, se olharmos é água, claro, mas não tem corrente, não tem vida. Tem mais alguma coisa?
Recentemente, ainda na semana passada, porque andei mergulhado noutras coisas, passou-me ao lado a história, e a polémica, do próximo Festival de Artes de Macau. Há dois factos a registar, o primeiro é o da língua portuguesa ter sido posta de parte durante os espectáculos. Quando até aqui tinhamos legendas por cima do palco, que nos davam toda a compreensão do que estava a decorrer, quer se tratasse de Ópera Chinesa ou de uma peça de Teatro, lá estava sempre a tradução escrita em simultâneo. Nesta edição isso já não vai estar presente, porquê, ninguém sabe ao certo. Alguém deve ter achado que não servia para nada ou que não era assim tão importante ter de pagar para ter esse serviço disponível.
Mais grave para mim é no entanto o Programa. Macau vive uma situação ímpar, todos os meses se batem os máximos nas receitas do Jogo. É sempre a velha história, da aplicação das verbas, das opções, do saber. O que é certo é que com todo este desafogo, como todo esse dinheiro se podia fazer mais qualquer coisa. Mais e melhor. Macau podia ser um eixo da cultura asiática, da cultura mundial. Podíamos ter concertos, peças de teatro, exposições, festivais, com os grandes nomes da vida artística de todo o mundo. Podiam vir pessoas em peregrinação de todos os cantos da Ásia até aqui, acampar à porta dos espaços culturais e esperar por um acontecimento único. Um acontecimento que iria ficar na memória de toda a gente. Nos de cá e naqueles que nos visitassem. E isso punha Macau no Mapa, retirando de certa forma o apelo ao Jogo que se sente por todo o lado e que é cabeça de cartaz em todos os guias turísticos.
Mas não. Parece que vamos ter mais, e sempre, uma fachada. Um nome a cumprir no calendário. De um período de tempo que tanto pode passar ao lado como pode despertar um pequeno incómodo, tanto faz. E nisto perde-se a noção do que se passa aqui dentro. Perde-se também o interesse. A esperança.
E deve haver por aí muito boa gente que deve achar que já é uma sorte ser assim.

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