O Espelho

Eu temia, em criança, que o espelho
Me mostrasse outra face ou uma cega
Máscara impessoal que ocultaria
Alguma coisa atroz. Também temi
Que o silencioso tempo desse espelho
Se desviasse do curso quotidiano
Das vãs horas humanas e hospedasse
Nos seus vagos confins imaginários
Inúmeros seres e formas e cores novas.
(Não o disse a ninguém; a criança é tímida.)
Receio agora que esse espelho encerre
O verdadeiro rosto da minha alma
Tão magoada de sombras e de culpas,
O que Deus vê e os homens talvez vejam."

Jorge Luís Borges em "História da Noite" (1977)

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