O Dr. Pedro Lobo era timorense e o homem mais rico do Extremo Oriente, segundo diziam.
Contava-se que iniciara a sua fortuna quando rebentou a guerra do Japão. Prevendo que viriam aí grandes dificuldades no abastecimento a Macau, na sua qualidade de Secretário para a Economia criou uns grandes armazéns e procedeu à nacionalização de todos os bens alimentares existentes nos diversos estabelecimentos e armazéns de Macau. Pagou esses bens alimentares que incluíam arroz, cereais, toda a espécie de latarias e não só, pelo seu justo preço e assim ninguém ficou prejudicado. Só que esses bens alimentares, à medida que o tempo foi passando com Macau em estado de cerco, foram escasseando e foram subindo astronomicamente de preço e toda gente para se alimentar tinha de os ir buscar àqueles armazéns.
Contava-se também que durante a guerra um dos homens que mais fez pela população de Macau foi um chinês a que chamavam Sei Um Me Oi (que penso significava "Aquele que não pode morrer"), e que naquela altura ainda tinha um tancar ancorado entre Macau e a Taipa, equipado com um motor a diesel. Durante a guerra saia para o alto mar para sequestrar os barcos que levavam mantimentos para as tropas japonesas e os trazia para alimentar Macau.
O Dr. Pedro Lobo que tinha uma vivenda onde morava e que se chamava Vila Verde, tinha em casa a única estação de rádio de Macau, a Emissora Vila Verde, que transmitia em português e em cantonense. Por outro lado ia ficando cada vez mais rico porque era o único cidadão a fazer legalmente contrabando de ouro. O ouro em Macau comprava-se por um preço muito inferior ao de qualquer outra parte do mundo. Fazia-se uma terrível perseguição a qualquer tentativa para contrabandear ouro. Só o Dr. Pedro Lobo fazia aterrar nas águas de Macau, todos os sábados, um Catalina (um hidroavião) carregado de ouro que a própria polícia ajudava a descarregar para umas lanchas que o traziam para terra.
Esse ouro era comprado em países que não tinham aderido ao acordo que fixava internacionalmente o seu preço como valor de referência para todas as moedas, e que o vendiam pela porta das traseiras a preços muito inferiores: o México e a Rússia. E aqui de Macau esse ouro entrava no circuito oficial aos preços universais o que dava um bom lucro (para o Dr. Pedro Lobo).
Havia também aqueles oficiais do nosso exército que aproveitavam a possibilidade de fazer um negócio simples e lucrativo e que por sinal eu fui dos primeiros a sber porque foi descoberto por um amigo meu, alferes, filho de um grande industrial e que me dizia - Pegas no teu vencimento, vais ao BNU e transferes para Portugal as tuas patacas. Uma pessoa de confiança em Portugal levanta o dinheiro em escudos e vai a um cambista e compra com esses escudos todos os dólares americanos que puder. Pega neles e mete-os numa carta registada com valor declarado e envia-os para ti em Macau. Pegas nos dólares e vais a um cambista trocá-los por patacas. As seiscentas patacas do teu ordenado que mandaste para Portugal agora são novecentas e vais repetir por aí fora até achares que já chega.
Muitos oficiais entraram nesta prática e só dois anos depois, quando o BNU começou a impôr restrições porque os montantes das transferências já atingiam valores supeitos, é que o negócio começou a encontrar obstáculos.
Eu não entrei porque não tinha ninguém de confiança em Portugal para me ajudar nessa operação e porque estava mais interessado em ganhar dinheiro com as minhas capacidades, a minha arte e os meus conhecimentos.
Muitas destas histórias faziam parte do script dos CAMINHOS LONGOS, bem como aquela história do jogo vedado a todos os funcionários do Estado que jogavam na mesma indo ao café do Hotel Central que tinha uma varanda no primerio andar da sala do jogo e que dava em baixo para o café. Os croupiers deitavam um cestinho pendurado por uma corda e cá em baixo o interessado sentado no café metia no cestinho a sua aposta e o dinheiro. E pronto, estava o caso arrumado.
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