As Minhas Memórias (23)

Um dia em que saí para ir dar uma volta, cheguei a um largo onde deparei com uma estátua grandiosa de uma imponente figura vestida com um kimono japonês. À volta da estátua, montes de flores, e várias pessoas colocando ainda mais flores.
Fiquei curioso e fui até à base da estátua para ver quem seria. Pensava que era algum Imperador mas... não senhor... era o Wenceslau de Morais, Cônsul de Portugal.
Acabei por ficar quase um mês no Japão. Fui de comboio até Osaka, atravessando o Japão dum lado ao outro, o que levou quase doze horas. Vi os imensos campos cultivados e aquela cortesia muito japonesa que põe duas pessoas que se encontram na rua fazendo vénias uma à outra, cada um procurando pôr a cabeça mais baixa do que o outro para mostrar a sua humildade.
Sempre acompanhado pela Machico Nakamura, conheci os seus pais e jantei em sua casa tipicamente japonesa, um jantar tipicamente japonês, sentados no chão e descalços, porque os sapatos ficam à porta, em volta de uma mesa baixa onde se vai cozinhando e comendo.
Mas as saudades de minha mulher e dos filhos começavam a apertar e chegara a altura de partir.
Foi um momento muito difícil. A Machico fartou-se de chorar e eu fiquei com uma imensa raiva de mim mesmo por ter criado esta situação em que insensatamente criara tanto sofrimento. Jurei que nunca mais em toda a minha vida cairia noutra situação igual. E não caí.
A minha mulher que veio a saber da minha aventura com a Machico, porque ela se fartou de me escrever e tive de me explicar, costumava gozar comigo e fazer troça dizendo que eu não sabia viver sozinho e tinha sempre de arranjar uma companhia, mesmo que fosse por pouco tempo...
Regressei a Macau e o meu amigo coreano nunca quis acreditar que eu tivesse sido submetido a uma busca por parte de tantos polícias da alfândega de Hong Kong e eles não tivessem encontrado o material. De qualquer forma o negócio acabou. Não houve mais malas para levar para o Japão, pelo menos, que eu tenha sabido.
E chegou novamente a altura em que era preciso encontrar um emprego.
Muito por acaso soube que o Colégio D. Bosco precisava de um professor de português para a segunda classe da escola primária e fui oferecer-me para o lugar.
O Director do Colégio, um Padre Salesiano, ficou um pouco desconfiado porque eu não apresentava credenciais que me habilitassem como professor de português.
Mas como a oferta não era muito abundante, resolveu pôr-me à prova aceitando-me à experiência.
E daqui resultou uma das experiências da minha vida de que mais me orgulho.

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