As Minhas Memórias (28)

Um colega das Finanças, mais tarde explicaria: - Sabes? O nosso Director tem um quarto no Hotel Polana que ocupa sem precisar de pagar. Não sei se era verdade ou não e para mim de qualquer forma tanto faria.
Comecei assim a frequentar todos os dias, depois das horas de serviço nas Finanças, a Torre de Controlo do Aeroporto de Lourenço Marques, porque era o único sítio onde se poderia encontrar o material de estudo para o tal concurso. Matérias: Regras do Ar, Meteorologia Aeronáutica, Legislação Internacional da ICAO (International Civil Aviation Organization) Códigos Internacionais, Rádio Ajudas, etc.
Dediquei-me afincadamente a este estudo porque estava em risco o meu futuro. E tive alguns confrontos porque havia na Torre um Controlador de Primeira enviado de Lisboa para orientar o controlo de tráfego aéreo em Lourenço Marques e com o qual tive algumas discussões porque havia procedimentos incorrectos a meu ver, em consequência de erradas interpretações da lei.
Ora regras de interpretação das leis era coisa que eu aprendera nas Finanças e, por exemplo, a Torre de Controlo estava a obrigar todos os pilotos a fazer um plano de voo antes de saírem.
Eu dizia que um piloto que vai voar segundo as regras do voo visual nunca precisava de preencher um plano de voo na forma que lhe era exigida. O Controlador de Primeira dizia que era assim porque estava na lei. E quando lhe pedi para me mostrar a lei, mostrou-me um artigo das regras do ar que dizia textualmente que todos os pilotos eram obrigados a preencher esse plano de voo com todas as exigências de níveis de voo, hora de chegada, velocidade e sei lá que mais. Só que eu virei as folhas das regras do ar e logo no primeiro artigo dizia que as regras do ar estavam divididas em dois capítulos, que o primeiro só se aplicava a voos visuais e o segundo capítulo a vôos por instrumentos. Portanto a exigência dos planos de voo só se aplicava a voos por instrumentos porque o tal artigo fazia parte do segundo capítulo.
E com tudo isto fui a exame escrito no qual obtive dezanove valores e na prova oral quando fui chamado, o Comandante Barata, que era o Director da Aeronáutica Civil e o examinador, limitou-se a dizer-me para eu falar qualquer coisa. E quando muito espantado perguntei sobre que assunto disse-me: - Pode ser sobre a sua vida em Lourenço Marques. E eu disse que não tinha muito para dizer porque estava lá há pouco tempo. E ele respondeu: - Já chega!
Ainda fiquei mais espantado (para uma prova oral num exame para controlador não me parecia grande coisa). E então ele explicou: - Sabe... os Controladores têm de falar para um microfone e eu só queria ouvir a sua voz. Pode sair.
Dos trezentos e poucos concorrentes para esse lugar de controlador da Aeronáutica Civil de Moçambique fui eu a ser admitido para essa única vaga.

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