GONE, BABY, GONE - é o título de um livro de Dennis Lehane de 1998, autor de Mystic River, Shutter Island, Coronado, entre outros, que Nuno Cotter manteve na sua tradução e foi editado este ano pela Gótica.
O desaparecimento de Amanda McCready, de quatro anos de idade é o tema central de mais uma investigação dos detectives privados Patrick Kenzie e Angela Gennaro, personagens que o referido autor também fez actuar em Sacred, Darkness Take My Hand ou A Drink Before the War. A dupla é chamada ao caso pela tia da menina, não só pela fama que estes grangearam com a resolução do caso Gerry Glynn, um assassino em série que actuava em Boston, mas pelo assinalável desinteresse da mãe pelo seu paradeiro, Helene McCready, uma toxicodependente. No decurso das investigações os detectives ficam perante a seguinte situação: acabam por um lado por descobrir e eliminar um grupo de pedófilos que tinha raptado várias crianças onde a descrição dos maus tratos infligidos quase faz desistir a leitura pelo arrepio e mal estar que provoca, tal o grau de insanidade e da certeza que pessoas assim existem, a par do nosso desconhecimento das profundezas do abismo humano. E por outro, polícias que actuam contra a lei que tratam de apanhar algumas crianças filhas de toxicodependentes ou em situações semelhantes de grande carência afectiva e que, através de documentação forjada, as entregam “legalmente” a famílias onde em princípio serão amadas e terão hipóteses de um futuro risonho, que afinal foi o que esteve na base do desaparecimento de Amanda.
Lionel McCready, irmão de Helene, anos atrás numa festa de despedida de solteiro de um dos seus amigos, envolveu-se numa briga. Antes de avançar para o seu opositor e de lhe rachar a cabeça com um taco de bilhar, ameaçou-lhe: “Afasta-te ou eu mato-te”, resultando assim os factos em tentativa de homicídio. No julgamento que se seguiu, Broussard, um polícia do Boston Police Department que tinha assistido aos acontecimentos mentiu, testemunhando a favor de Lionel e safou-o. Da amizade que a seguir se foi cimentando veio o desabafo um dia de mais uma negligência de Helene: tinha encontrado uns tipos com um saco de erva e foi com eles, deixando Amanda adormecida na praia e a miúda sofreu um escaldão horrível. Só não foi processada pela Protecção de Menores porque Lionel (mais uma vez) intercedeu. Depois de mais não sei quantas do género, aceitou a solução proposta por Broussard: fazer desaparecer Amanda e entregá-la a um lar cheio de afecto com a contrapartida do silêncio total sobre o assunto.
No fim, Lehane intensifica o drama descrevendo com mestria cinematográfica a acção policial que leva à recuperação da criança. E como quem está a assistir a filmagens, vemos a representação do enlevo com que os detectives e os agentes policiais durante um par de horas vigiam a família adoptiva e o aconchego do novo mundo de Amanda, e a acesa discussão que entre eles estala sobre se era certo retirar a miúda daquela família com as consequências processuais penais que se seguiriam (envolvimento criminal de polícias, falsificadores de documentos, famílias adoptivas, etc) e a sua entrega a um “arsénico”chamado Helene.
Neste caso, Helene acaba por ter uma segunda oportunidade. Gone, Baby, Gone é leitura essencial à luz dos casos da pequena Maddy e da menina Esmeralda, bem como dos de todas as crianças que diariamente por esse mundo fora desaparecem, sem deixar rasto.
Gone, Baby, Gone de Dennis Lehane • CIVILIZAÇÃO EDITORA
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