Quando cheguei a Macau ao fim de tantos anos (havia chegado a Macau pela primeira vez em 1951) graças à minha querida filha Belinda, foi como se tivesse renascido. Macau estava diferente mas havia muita coisa que eu reconhecia. Peguei na minha câmara digital e comecei a filmar a cidade. Valeu-me o conhecimento de novos amigos que vieram ao meu encontro e me ajudaram de uma forma inesquecível, como o Pedro Simões que me valeu em diversas ocasiões de aflição encomendando-me quadros da filha, da mulher e até um auto-retrato que ofereceu à minha filha Belinda. Pintei diversos retratos a óleo para amigos, o que me tem permitido sobreviver para além de uma aposentação mínima que foi a minha mulher que me conseguiu antes de adoecer.
E um dia, ia eu a passear pela Almeida Ribeiro, quando passei por uma jovem chinesa que me fixou nos olhos quando passávamos um pelo outro e eu fixei-a a ela porque aquele olhar era encantador e sereno, como se falasse. Depois de passar por ela parei e olhei para trás. Ela tinha feito o mesmo e estávamos ali a olhar um para o outro parados quando ela me acenou para que me aproximasse.
Começámos a conversar, eu contei-lhe um pouco da minha vida, convidei-a para jantar e ela disse-me que estava em Macau temporariamente porque era da China e só tinha visto para um mês. Acabámos por nos entender e eu levei-a a casa da minha filha várias vezes, onde estava a viver, até que a minha neta Bárbara me disse para não a levar mais vezes. A partir dessa altura a minha filha Belinda, de quem eu era convidado, comprou-me um bilhete de avião para eu voltar para Portugal e assim foi. Mas por pouco tempo. Porque pouco depois comprei uma passagem de Portugal para Macau e regressei. Desta vez foi o meu filho Luís que também trabalha em Macau que pôs à minha disposição um quarto em sua casa para eu viver. Não fiquei lá por muito tempo. Aluguei um quarto e fui viver com a minha companheira que conhecera da vez anterior.
Porém a má sorte perseguia-me e apareceu-me um problema de saúde grave e a minha filha mais uma vez foi a minha salvadora. Conseguiu-me a licença de residência e a entrada no Hospital onde fui operado e onde fui tratado de forma irrepreensível a um tumor. Saí completamente bem e, sem ter sofrido, voltei à luta. Eu tinha feito um pequeno livro sobre a história do cinema, a sua influência na formação da América e a forma como o cinema europeu tinha sido dizimado, o qual enviara em tempos ao Doutor Charter de Azevedo, representante da União Europeia em Portugal, que me escrevera a dizer que com este livro eu tinha "contribuído para uma nova visão na formação da Europa". Era um grande penacho embora não tivesse ganho nada com isso. Na realidade a União Europeia criou o programa Média e parece que está a querer fazer alguma coisa em prol de um cinema europeu.
Preocupado como sempre estive com a falta de formação no nosso país em matéria de cultura cinematográfica, mandei uma cópia desse meu livro à Directora da Escola Portuguesa de Macau, sugerindo que se criassem as aulas de Educação Cinematográfica naquela Escola.
Em resposta recebi uma carta em que se dizia que as aulas de educação cinematográfica "não se coadunam com o nosso sistema educativo."
Estive quase para responder que em África já ouvira uma resposta igual por parte de um régulo a quem o Administrador sugeria que criasse uma escola para ensinar as populações a ler e a escrever. Na altura ouvi precisamente o mesmo.
Entretanto casei-me com a tal jovem chinesa que demonstrou uma dedicação que eu nunca esperaria, acompanhando-me incansavelmente durante o período do meu internamento no Hospital e cuidando de mim quse como se de um filho se tratasse. Mas não lhe concederam licença de residência em Macau e apesar de estar casada comigo e viver comigo, tem que periodicamente estar ausente na China para conseguir um passaporte e um visto que lhe permita estar em Macau. O que não faz muito sentido.
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