Quando já íamos no segundo ou terceiro episódio o Senhor Victor Manuel (que era um grande forreta e a quem os seus próprios colaboradores chamavam o Tio Patinhas), começou a dar ordens aos meus manipuladores para a forma como deviam actuar. Aí eu intervim e disse-lhe: - Meu caro senhor, os meus marioches sou eu quem dirige e o senhor não tem que se meter. - Isso é que era bom, respondeu-me ele. E eu não fiz mais nada. Virei-me para o operador que era funcionário do Victor Manuel e disse-lhe: - Por favor pegue na câmara e ponha-se na rua. Depois virei-me para o restante pessoal e declarei: - Meus senhores a Pandilha do Tomé acabou hoje e aqui.
O pessoal foi-se embora, eu desliguei os projectores e durante quatro dias insistiram comigo para que se voltasse ao trabalho. Uma das pessoas que mais pressão fez sobre mim foi o meu amigo Gomes Pereira que não tinha nenhum interesse nesta questão mas queria ver os marioches a trabalhar. Por fim cedi numa condição. O senhor Victor Manuel nunca mais dirigiria a palavra aos meus manipuladores. E assim foi. Até ao fim da série o senhor Victor Manuel nunca mais meteu o bedelho na nossa actividade. Mas havia muitas coisas na série que não me agradavam. Por exemplo, a RTP exibia os programas às nove da manhã de domingo.
Eu pensava que ninguém iria ver àquela hora e naqueles dias o nosso trabalho. Mas, ao fim da primeira série de treze episódios a RTP renovou o contrato, coisa que só fazia quando os níveis de audiência subiam. Fizemos no fim vinte e seis episódios da série - A Pandilha do Tomé. Foi engraçado porque um dia um colaborador nosso que tinha um teatro de fantoches convidou-me para levar a uma escola primária os meus bonecos para as crianças verem. E quando lá cheguei qual não foi a minha surpresa quando fui envolvido por dezenas de miúdos que gritavam e apontavam para os bonecos, lhes citavam os nomes e contavam as aventuras deles na série da RTP.
Entretanto eu planeava novas produções e então ocorreu-me que seria engraçado ver os meus marioches contracenarem com figuras políticas e largar umas bocas sobre a situações do nosso País e fiz um boneco que era uma caricatura do Doutor Mário Soares e outra do Doutor Cavaco Silva.
Depois elaborámos um pequeno filme em que o professor Cavaco Silva cantava a mula da cooperativa e não só. Proferia um discurso cantinflesco. Propuz então à RTP fazer um programa aproveitando essa ideia mas a RTP preferiu dar um trabalho do mesmo género à senhora Mafalda Mendes de Almeida que começou a fazer um programa de caricaturas políticas em que os bonecos de técnica muito primitiva não se pareciam em nada com os supostos caricaturados.
Entretanto, sem eu saber, alguém aproveitou as minhas imagens do Cavaco Silva, para as incluir num vídeo promocional que correu na RTP, de um conjunto musical que lançara um CD com uma música intitulada: "Tu queres ECUS."
A Dona Mafalda Mendes de Almeida então foi a Inglaterra buscar um português que fazia caricaturas políticas para um programa intitulado "The Spitting Image".
Começou então a produzir o "Contra Informação" em que o trabalho desse jovem trazido de Inglaterra já era digno de se ver.Também veio contratar os meus manipuladores que passaram a fazer o seu trabalho para o "Contra Informação".
É curioso que o programa "Spitting Image", em Inglaterra, por sua vez, acabou.
Os marioches ainda participaram em alguns publicitários, mas praticamente entraram em repouso. Não fizeram mais programas. O Cocas e o Jimmy Henson também tinham passado à história. Jimmy Henson morrera e o seu filho ainda continuara por uns tempos.
O actor principal da Pandilha do Tomé, o Mário Sargedas, também morrera. A sua personalidade, de homem bom e paciente são inesquecíveis para mim. O papel que ele desempenhou na série em que fazia de um velho com uma loja de reparações de electro domésticos, fazendo bonecos para a sua netinha se divertir, mas que ficara só com os bonecos quando ela partira com os pais para o Brasil, acabara por ver esses bonecos ganhar vida e com ele viver grandes aventuras que envolveram aquelas crianças que passaram a frequentar a sua loja (electrodomésticos já não lhe interessavam), ficou-me no coração.
Ainda hoje sinto saudades desses marioches.
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