As Minhas Memórias (37)

Uma das coisas de que já me tinha apercebido era que diante do Ruiz não se podia falar mal dos africanos. A menor referência racista ou de superioridade despoletava uma imediata reacção por parte do Ruiz em defesa dos alvejados. Mais tarde vim a perceber o porquê desta devoção aos africanos.
Entretanto andávamos quilómetros por dia no meio do mato e por vezes ficávamos de atalaia na proximidade das fontes de água, onde assisti a algumas cenas interessantes como aquela de um elefante enorme que apareceu, parou no meio de uma picada perto de um lago, olhou em volta e voltou para o mato . Passados uns momentos voltou seguido de uma manada de fêmeas com as suas crias que correram para a água onde entraram e se divertiram a beber água e a regarem-se uns aos outros com as trombas como se fossem mangueiras. O macho líder da manada ficou na margem a observar e quando acabaram saíram todos em fila e penetraram de novo na floresta.
Mas do Leão nem sombras.
O Ruiz ainda tentou um truque ilegal para ver se panhava um leão. Pendurou uma impala numa árvore e durante a noite deixou um dos seus ajudantes de atalaia para ver se vinha algum leão comê-la. A verdade é que a impala foi comida mas não se conseguiu ver quem a comeu.
Ora a certa altura o Senhor Georges Bates recebe a visita de um seu amigo de Chicago que veio visitá-lo no acampamento e resolve dar-lhe uma espingarda e comprar-lhe uma licença para caçar um búfalo. O George Bates queria fazer do amigo um caçador. Assim, um segundo caçador, adjunto do Ruiz, foi com ele caçar um búfalo. No dia seguinte o caçador adjunto veio dizer-nos que o caçador amador tinha ferido um búfalo que fugira.
A partir daí tudo mudou. Existia uma determinação rigorosa por parte da Veterinária (que era o organismo que superentendia em todo este processo dos caçadores profissionais), impondo que a caçada ao búfalo ferido tivesse prioridade absoluto sobre todas as outras acções até ser abatido.
Isto porque é sabido que um búfalo ferido se torna num assassino que mata o primeiro ser humano que conseguir encontrar.
E assim andámos dois dias de caminhada a perseguir o búfalo ferido. O pisteiro ia contando histórias dizendo que o búfalo tinha passado ali... que tinha parado acolá... que encontrara um outro búfalo aqui... etc.
Eu, ao fim do segundo dia de andanças já não acreditava em nada.
Assim, na frente seguia o pisteiro, logo atrás o Ruiz, atrás dele um carregador que lhe levava a espingarda, atrás deste ia o amigo do George Bates e o caçador adjunto, depois mais um carregador seguido pelo George Bates, e por fim... eu.
De súbito de um tufo de vegetação sai o búfalo em corrida direito ao pisteiro. Este dá um salto e trepa por uma árvore de micaias, que é uma árvore que tem uns picos enormes, e fica o Ruiz de frente para o búfalo que vem em corrida. O Ruiz volta-se para o carregador que lhe atira a arma e foge. O Ruiz recebe a arma, puxa a culatra atrás e no mesmo movimento enfia a bala na espingarda e dispara. O búfalo está a pouco mais de um metro de o apanhar. Leva com a bala
no peito e estaca com a força do impacto da bala. Depois corre para o tufo de vegetação e desaparece.
Ficámos todos estáticos. Eu nem tive tempo de preparar a máquina de filmar e assim perdi a minha mais interessante reportagem.
Passados instantes o pisteiro empoleirado na árvore de micaias gritou: - Eu estou a vê-lo.
Está ali deitado. O Ruiz gritou-lhe: - Então dá-lhe um tiro.
O pisteiro que levava uma arma à tiracolo, assim fez. Depois o Ruiz foi até ao tufo de vegetação onde o búfalo ainda vivo e arfando estava deitado e acabou finalmente com o problema.
Para terminar o dia o pisteiro para descer da árvore de micaias levou quase meia hora porque cada vez que se mexia era picado pelos espigões poderosas daquela árvore. Nunca percebi como ele conseguiu subir tão depressa quando viu o búfalo a correr para ele.
À noite, no acampamento, a Vera Cardiga agradeceu ao carregador que atirara a arma ao Ruiz antes de fugir e ofereceu-lhe uma recompensa em dinheiro.

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