As minhas relações com o Courinha Ramos entretanto começaram a deteriorar-se porque a mulher dele era uma fantástica gastadora e o Courinha Ramos para ela era um mãos rotas.
Certa vez o Centro de Informação e Turismo encomendou-nos uma série de cópias de 16 milímetros de um documentário que havíamos produzido sobre turismo cinegético. O CIT até pagou adiantado e o Courinha Ramos disse-me: - Vamos no meu carro até Joanesburgo para fazer este trabalho. No dia seguinte ele apareceu com o carro e levava a mulher consigo. Explicou que ela queria fazer umas compras em Joanesburgo. Quando as cópias estavam prontas e íamos regressar o Courinha diz-me: - Olha, desculpa mas tens de regressar de comboio. Não cabes no carro porque a minha mulher o encheu com as compras que fez. E, claro, o dinheiro das cópias, foi-se.
Eu, aliás, já não precisava do Courinha Ramos para nada. Havia montado mais um laboratório de revelação de filmes com base numa máquina de revelar a cores que comprei em segunda mão na África do Sul a um laboratório que fechara. Fundara a FILMLAB e dedicara-me à produção.
A estreia do Zé do Burro em Lourenço Marques foi um sucesso. As pessoas riam com as macacadas do Zé Bandeira e divertiam-se com as situações.
Assim levei o filme até Angola para ser estreado em Luanda, o que aconteceu num daqueles cinemas ao ar livre que eram tão populares em Luanda. Na fachada um grande cartaz com o saloio do Zé ao lado do seu amigo, o burro Cacilhas.
Depois levei o filme até Lisboa. Aí tive um problema. O filme tinha cerca de hora e meia e a censura cortou cerca de trinta e cinco minutos. Estreou no cinema Odeon e não obteve grandes resultados.
Durante a minha estadia tive ocasião de ir visitar o César de Sá, que estava retirado a viver da venda de bilhetes postais de Lisboa para os turistas.
Também reencontrei o meu irmão mais novo que estava num estado lastimoso. Alcoólico em último grau e estava a sofrer de um tumor na virilha.
Quando voltei a Moçambique, levei-o comigo.
Assim que cheguei entereguei-o a um médidco meu amigo que o enfiou no Hospital.
Esteve lá um ano mas quando saiu vinha como novo. Porém o médico avisou-o: - Nunca mais na vida você pode tocar em alcool.
Aqui convém explicar quem era este meu irmão. Fizera carreira toda a sua vida, como vendedor. Na realidade era um vendedor fora de série. Contaram-me que um dia, a precisar de dinheiro para os copos viu num jornal um anúncio de uma editora pedindo um vendedor. Foi-se oferecer e depois de ouvir o que tinham para vender disse-lhes: - Isto são tudo livros baratos. Vocês não têm nenhuma edição mais valiosa?
Responderam-lhe: - Por acaso até temos. Uma enciclopédia de luxo intitulada "O Barco" que não se vende. Foi um espetanço nosso.
O meu irmão disse-lhes: - Dêem cá isso. e foi pedir uma audiência no Palácio de Belém para falar com o Almirante Américo Tomás, Presidente da República. Depois de conseguir a audiência vendeu uma enciclopédia ao Almirante e pediu ao Chefe da Casa Militar para lhe dar uma carta dizendo que o Senhor Almirante tinha comprado a enciclopédia sobre o barco desde as suas origens até aos dias de hoje e tinha gostado muito.
Depois com essa carta foi vender enciclopédias a todos os oficiais superiores da Armada.
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